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Contagem inaugura série de audiências municipais sobre a volta do trem de passageiros

4 de abril de 2025, por lorena.carazza

A volta do trem de passageiros na Região Metropolitana de Belo Horizonte e entorno foi tema de uma audiência pública na Câmara Municipal de Contagem, na tarde desta quarta-feira (02/04). O encontro, promovido pelo mandato da vereadora Adriana Souza (PT), reuniu participantes remotos e presenciais: cidadãos de pelo menos 12 cidades do estado, vereadores das cidades de Belo Horizonte, Ribeirão das Neves e Santa Luzia, a vereadora Moara Saboia (PT), o vice-prefeito de Moeda, representantes dos deputados Miguel Ângelo e Ricardo Campos, além de estudiosos e pesquisadores do tema.

Estiveram presentes também líderes partidários, representantes do Poder Executivo e da Ouvidoria da Câmara, o Sindimetro-MG, além de membros de vários movimentos sociais, como o Movimento pela Volta do Trem de Passageiros na RMBH, que já tem presença em 17 cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Representando o Governo Federal, participaram da audiência o coordenador-geral de obras e projetos da Secretaria Nacional de Transporte Ferroviário, Henrique Oliveira Mendes, e o analista de infraestrutura do Ministério das Cidades, Leandro de Andrade Martins.

Abordagem técnica

As discussões técnicas sobre a implantação, revitalização, expansão e planejamento dos traçados ferroviários contaram com presenças importantes. A primeira foi a do presidente do Instituto Cidades e diretor da ONG Trem, o ferroviarista André Tenuta, que destacou a perda de tempo e recursos para as implantações ferroviárias em Minas. Segundo Tenuta, após a concessão de 30 anos (1996-2026) da malha viária brasileira para diversas concessionárias, houve uma subutilização das ferrovias, e os recursos e outorgas pagos pelas concessionárias ao Governo Federal não estão sendo repassados aos estados que têm direito sobre eles, de acordo com a Lei das Ferrovias (14273/2021). “Minas Gerais, por exemplo, por ter linhas da MRS e da Vitória Minas, deveria obrigatoriamente receber esses valores, mas não recebeu nenhum centavo até agora”, destacou.

Esses recursos, segundo ele, poderiam ser usados, por exemplo, na implantação do projeto do trem metropolitano, que atenderia Belo Horizonte, Contagem e Betim. Ele ligaria a Estação Central até Betim, com duas paradas: uma no Beatriz, em Contagem, e outra já próxima à Fiat, em Betim. “O custo disso, em outubro de 2023, quando propomos, estava na faixa de R$ 335 milhões. E naquele momento, a MRS e a Vitória Minas já tinham pago de outorga R$ 1,9 bilhões. Ou seja, já teria dado para ter implantado esse projeto de trem metropolitano seis vezes, mas não foi usado nenhum centavo”, exclamou.

O engenheiro e especialista em transporte e trânsito, Afonso Carneiro Filho, falou sobre as atribuições dos órgãos governamentais – Ministério dos Transportes, Infra.SA, Dnit e ANTT nas ferrovias outorgadas – e criticou o modelo atual de concessões no Brasil. Segundo ele, a forma vigente só atendeu corredores de exportação, deixando todo o resto do mercado interno – pequenos e médios produtores – sem o serviço ferroviário. “Com isso, desativaram várias linhas e deixaram apenas os ramais principais. Hoje, as concessionárias estão devolvendo quilômetros e quilômetros de linhas no bagaço”, analisa o especialista. “O descaso com as ferrovias foi enorme; questionamos a fiscalização, que, com isso tudo, parece que não existiu”.

Outra exposição técnica foi realizada pelo presidente do Instituto Diadorim para o Desenvolvimento Regional e Socioambiental, senhor Gustavo Gazzinelli. Em sua apresentação, o expositor apresentou estudo elaborado pelo Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado Metropolitano (PDDI), que propõe a implantação de trens de passageiros em conjunto com os trens de carga. O plano, encaminhado ao Governo Federal, sugere a criação de cinco linhas: de Belo Horizonte a Sete Lagoas, com possibilidade de extensão até Curvelo; de Conselheiro Lafaiete a Ibirité; de Divinópolis a Juatuba; de Mariana a Sabará; e de Caeté a Santa Bárbara.

O plano também apresentou um quadro das necessidades ferroviárias da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), tendo em vista que, para a efetiva implantação das linhas, alguns trechos exigem duplicação, outros necessitam de retificação, e outros, ainda, demandam reimplantação da via férrea. “O trem pode mudar a nossa realidade, nosso modelo econômico, pode criar uma alternativa de desenvolvimento que hoje nós não temos. Minas Gerais está perdendo o trem há bastante tempo”, finalizou o presidente do Instituto.

O cientista social Roberto Willians de Santana, membro do Instituto da Qualidade Ferroviária, abordou o desenvolvimento regional, os impactos econômicos locais e o retorno do trem de passageiros na RMBH e em seu entorno. Destacou que a ausência de investimentos em mobilidade e infraestrutura, especialmente ferroviária, resulta no estrangulamento das vias de transporte existentes, provocando não apenas o aumento do tempo e do custo de deslocamento de passageiros, como também a limitação ao pleno desenvolvimento do setor industrial, que depende do transporte de cargas.

Por fim, o expositor apresentou diversos benefícios econômicos, sociais e ambientais decorrentes da retomada do transporte ferroviário de passageiros, com impactos diretos na qualidade de vida da população e no desenvolvimento regional, estimando-se impacto econômico total da ordem de R$ 2 bilhões anuais. “Está na hora de Minas cobrar sua fatura. Aqui é a maior malha ferroviária do país, e é a que mais perde”, concluiu, sugerindo que a implantação do sistema de trens de passageiros seja viabilizada por meio de consórcios intermunicipais e parcerias público-privadas.

Trecho Contagem–Betim

Maria Madalena Franco Garcia realizou um breve retrospecto dos estudos de viabilidade e dos projetos elaborados para a extensão da linha férrea entre os municípios de Contagem e Betim, desde a década de 1970, quando foi realizado o primeiro estudo do denominado “trem de subúrbio”, que ligaria a Estação São Gabriel ao município de Betim.

Desde então, a ligação ferroviária entre as duas cidades foi contemplada em diversas ocasiões, como no Plano Diretor de Transporte sobre Trilhos, contratado em 1998 pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) – responsável pelo metrô de Belo Horizonte até sua privatização, em 2023 – e no Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado Metropolitano (PDDI), que contou com a participação dos 34 municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Em 2015, o Governo do Estado, com recursos federais, contratou o projeto da Linha 4 (Novo Eldorado–Betim), realizando novo estudo de viabilidade do trecho. “Ou seja, temos vários estudos de viabilidade. Estamos no momento de não fazer novos estudos, mas de implantar a linha até Betim”, reivindicou.

O projeto da Linha 4, dentre sete traçados possíveis, definiu a extensão de 3,4 quilômetros da linha atual do metrô, até a avenida João César de Oliveira, e, a partir desse ponto, a implantação do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) até Betim. Assim, após a Estação Eldorado – onde hoje termina o itinerário do metrô – seriam construídas as estações Novo Eldorado, Parque São João e João César de Oliveira, de onde partiria o VLT até Betim, seguindo o traçado da avenida Marco Túlio Isaac.

A relevância do traçado e da expansão do transporte sobre trilhos foi reforçada também pelo assessor da presidência da Transcon, senhor Marco Antônio Silveira. “Vejo que não podemos pensar em mobilidade na Região Metropolitana apenas sob a ótica do trem, ou do ônibus ou do carro, mas sob a ótica de uma grande integração”, explicou. Silveira destacou o investimento superior a R$ 1 bilhão realizado pela Prefeitura de Contagem, em parceria com o Governo Federal e o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), no Sistema Integrado de Mobilidade (SIM), que permitirá maior integração com o metrô e o VLT.

Sobre as iniciativas da Prefeitura, Silveira ressaltou três momentos importantes: o evento de junho de 2023, que reuniu as prefeituras de Belo Horizonte, Contagem e Betim para discutir o transporte de passageiros sobre trilhos; a entrega, em janeiro de 2024, ao Ministério dos Transportes, do projeto anteriormente apresentado em audiência pelo especialista André Tenuta; e, por fim, a participação de Contagem na audiência pública sobre a renovação da concessão de ferrovias da Ferrovia Centro-Atlântica (FCA). Na ocasião, a prefeita Marília Campos entregou carta à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), solicitando que parte dos recursos oriundos da outorga da concessão seja investida na expansão do metrô e dos trens de passageiros da Região Metropolitana de Belo Horizonte.

Posição do Governo Federal

A participação remota do coordenador-geral de Obras e Projetos da Secretaria Nacional de Transporte Ferroviário, senhor Henrique Oliveira Mendes – vinculada ao Ministério dos Transportes – reacendeu as expectativas quanto à concretização de linhas de longa distância no estado. Segundo o coordenador, o Brasil está entre os cinco países do mundo com mais de 2 milhões de quilômetros quadrados de área, população superior a 100 milhões de habitantes e Produto Interno Bruto (PIB) acima de 1 trilhão de dólares; entretanto, entre esses países, é o que apresenta a menor extensão de malha ferroviária.

Em âmbito nacional, estudo realizado entre 2020 e 2021 pelo Laboratório de Transportes e Logística da Universidade Federal de Santa Catarina apontou que, dentre 407 possíveis ligações ferroviárias de trens de passageiros no Brasil, dois dos trechos mais viáveis localizam-se em Minas Gerais e já estão em fase de estudo pela Infra S.A.: Belo Horizonte–Sete Lagoas e Belo Horizonte–Divinópolis. Este último, que contempla os municípios de Contagem, Betim e Itaúna, é considerado prioritário e já possui estudos detalhados.

De acordo com o coordenador, a viabilização do trecho depende, agora, de uma justificativa formal que o insira na carteira de projetos do Governo Federal, sendo essencial, para tanto, o pleito do Governo do Estado ou a formalização da solicitação por parte dos municípios, com o devido detalhamento técnico. Após essa etapa, o projeto deverá passar pelos trâmites legais que envolvem audiências públicas, apreciação pelo Tribunal de Contas da União e processo licitatório.

A participação do analista de infraestrutura do Ministério das Cidades, senhor Leandro de Andrade Martins, apresentou as mais recentes iniciativas do Governo Federal em relação à mobilidade urbana da RMBH. A primeira delas foi a concessão de 2022, com aporte federal de R$ 2,8 bilhões para a modernização da Linha 1 do metrô, sua expansão até o Novo Eldorado e a construção da Linha 2 (Barreiro).

A novidade são as tratativas iniciadas em 2023, que visam à expansão da Linha 1 até o Viaduto do Beatriz, integrando-a ao Sistema Integrado Municipal de Transporte de Contagem, além da construção da Linha 3 subterrânea, ligando os bairros Savassi e Lagoinha. “Reforçamos, aqui, o compromisso do Governo Federal de estarmos juntos e destacar a importância dessa agenda institucional”, concluiu.

Coletividade e a força da Câmara Municipal

A vereadora Moara Saboia enalteceu a realização da audiência pública e a união dos municípios, ressaltando que os problemas da RMBH são coletivos e que a pauta da mobilidade urbana é recorrente em todas as Câmaras Municipais. Ao reforçar a importância do movimento, destacou também a necessidade da participação ativa de prefeitos e deputados na pauta.

Encerrando a audiência, a vereadora Adriana Souza agradeceu a ampla adesão ao encontro e salientou a importância do protagonismo do Legislativo municipal diante de uma pauta tão complexa e abrangente. “É necessário que as cidades se levantem, porque, infelizmente, temos um governador que não se importa com a mobilidade urbana e, em função disso, precisamos tomar a iniciativa juntamente com os movimentos sociais.”

A vereadora enfatizou que Minas Gerais detém a maior malha ferroviária do País, mas que “só serve para carregar minério, deixando de fora a população”, e alertou que, sem a reativação do trem de passageiros, a Região Metropolitana tende a retroceder do ponto de vista da mobilidade e da qualidade de vida da população. “Esta é a primeira audiência das cidades, e espero que seja a primeira de muitas”, finalizou. A próxima audiência está marcada para ocorrer na Câmara Municipal de Belo Horizonte, no dia 8 de maio, por solicitação dos vereadores Dr. Bruno Pedralva (PT), Helton Junior e Luiza Dulci (PT).

Encaminhamentos

Ao final da audiência pública, foram definidos os seguintes encaminhamentos: Formação de uma Frente de Vereadores da RMBH e de uma Comissão Especial na Câmara Municipal de Contagem; Protocolo de requerimentos e moções sobre o tema; Elaboração e envio de carta política aos governos estadual e federal; Convocação de audiências públicas sobre o tema em outros municípios; Encaminhamento de ofício ao Ministério dos Transportes para solicitação de reunião com o ministro Renan Filho, a fim de tratar da pauta.

Clique aqui e confira as fotos da audiência no Flickr da Câmara Municipal de Contagem.

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